Intel redireciona apoio ao Open Source à sua estratégia corporativa

A Intel, uma das maiores colaboradoras do software livre, está mudando sua postura em relação a ele. Após anos figurando entre os principais contribuidores do kernel Linux — chegando a ser responsável por cerca de 11% dos commits na versão 6.15 —, a empresa está restringindo sua atuação em projetos que não tragam benefícios diretos à sua estratégia comercial.

A mudança ocorre em meio a uma reestruturação interna motivada por dificuldades financeiras enfrentadas em 2024 e 2025, que resultaram em demissões em massa e realocação de equipes, especialmente na área de engenharia de software e manutenção de drivers Linux.

Durante a Intel Tech Tour 2025, o vice-presidente de engenharia de software afirmou que a nova diretriz é priorizar projetos open source que beneficiem diretamente a Intel e fortaleçam sua posição competitiva, deixando de lado contribuições que possam favorecer concorrentes.

A comunidade open source reagiu com frustração e tristeza. Ao longo de mais de duas décadas, a Intel construiu uma reputação sólida como aliada do software livre, contribuindo com melhorias significativas em compiladores como GCC e LLVM, otimizando drivers, frameworks de IA e bibliotecas de vídeo como SVT-AV1 e SVT-HEVC.

Seu envolvimento em projetos como o Cloud Hypervisor, OpenVINO, Sound Open Firmware e Mesa sempre teve impacto que ia muito além dos seus próprios produtos, beneficiando todo o ecossistema — inclusive concorrentes diretos como AMD.

Essa nova filosofia já mostra reflexos concretos. A distribuição Clear Linux, desenvolvida pela própria Intel e famosa por seu desempenho otimizado para x86_64, foi encerrada, após uma década de existência.

Diversos engenheiros experientes deixaram a empresa, migrando para concorrentes como NVIDIA e Meta. Alguns subsistemas do kernel Linux, como o driver de monitoramento térmico de CPUs Intel, foram marcados como “sem manutenção”, e pacotes Debian mantidos pela empresa ficaram órfãos.

Agora, pairam dúvidas sobre até onde a Intel pretende restringir suas contribuições. A nova postura levanta preocupações sobre um possível retrocesso no ethos colaborativo que sustenta o open source.

Embora a Intel afirme que continuará contribuindo com drivers e suporte para seu próprio hardware, a estratégia mais “fechada” contrasta com o legado de líderes anteriores da área de open source dentro da companhia.

A redução de engenheiros e a ênfase em vantagem competitiva no discurso da liderança atual sinalizam uma ruptura clara com a visão de que “a maré alta levanta todos os barcos”.

O impacto dessa mudança ainda está por vir, mas o sentimento atual entre especialistas e entusiastas é de decepção. A Intel, que já foi referência em práticas abertas e colaboração, parece agora trilhar um caminho mais corporativo e conservador, colocando em xeque uma das bases mais admiradas de sua atuação no setor de tecnologia.

Se a empresa limitar otimizações em compiladores, contribuições para o kernel ou deixar de colaborar em frameworks amplamente utilizados, pode não só prejudicar a comunidade, mas comprometer sua própria imagem junto a um público historicamente fiel.

Muitos usuários escolhiam processadores Intel justamente pela excelente compatibilidade com Linux e o suporte ativo da empresa à plataforma. A empresa esclareceu posteriormente que continua comprometida com o open source, mas agora com foco em iniciativas que destaquem seus diferenciais de mercado.

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