A Internet está morrendo mas ha tempo de salvá-la

Artigo publicado por Theena Kumaragurunathan - “The Internet is Dying. We Can Still Stop It” — analisa o fato de que quase metade do tráfego online compor-se de atividades não humanas. Se nada for feito, corre-se o risco de assistir à transformação da internet em um espaço zumbi, um simulacro de si mesma.


Penso nas primeiras vezes em que me conectei à rede. Para muitos que nasceram nos anos 80, a lembrança é vívida: o barulho do modem discando, o navegador Internet Explorer abrindo lentamente, a sensação quase mágica de estar diante de um universo novo.

Em 2001, aos 18 anos, entrei pela primeira vez em um café com internet. Naquele tempo, cada clique parecia uma descoberta. Eu queria ser cineasta, mas morava no Sri Lanka, longe de qualquer acesso a conhecimento técnico.

Bastou uma hora online para perceber que tudo o que eu precisava estava a poucos cliques de distância. A internet era o paraíso dos curiosos — um território livre, feito por pessoas para pessoas.

Mas, o que antes era um espaço de aprendizado e troca autêntica, transformou-se numa floresta de conteúdo automatizado, otimizado para algoritmos e dominado por inteligências artificiais. As páginas pessoais, desapareceram, substituídos por feeds infinitos e impersonais.

Pesquisadores como Muzumdar e colaboradores, no artigo The Dead Internet Theory: A Survey on Artificial Interactions and the Future of Social Media, descrevem esse fenômeno como a “Teoria da Internet Morta”.

Eles identificam que, desde o final da década de 2010, cresce a percepção de que a internet perdeu sua vitalidade. As interações humanas deram lugar a robôs, perfis falsos e conteúdos gerados por máquinas.

A promessa de uma rede global de conhecimento e criatividade tornou-se uma vitrine para prender a atenção e lucrar com dados. Mas há esperança. A internet não precisa morrer — ela pode ser reconstruída, resgatando o senso de autoria, de curiosidade e de comunidade que a originou.

É voltar a criar, escrever, compartilhar e dialogar como seres humanos, não como peças de um algoritmo. Cada blog, cada fórum, cada página pessoal que nasce ou renasce é um pequeno ato de resistência.

A internet que conhecemos e amamos pode estar em coma, mas ainda respira. Cabe a nós decidir se ela será desconectada de vez — ou se a reconectaremos à sua essência mais humana.

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Acabar com o chorume, leia-se redes sociais, já seria um grande passo.

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É incrível como se perdeu completamente a noção do que de fato se leva como experiência ou lembrança. Como bem relatado pelo texto, o saudoso autor cita o som do moldem, as pessoas e o universo desconhecido como experiências. Nada haver com produtos ou propagandas.

A internet virou uma grande encheção de saco. Encontre o “x” para liberar os outros 50% a 90% da sua tela (e em alguns segundos iremos te encher disso novamente). Saco… não sei se estou ficando velho, mas estou cansado de me submeter a isso… tenho preferido não navegar.

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Acabar com uma plataforma inteira usada por milhões de pessoas apenas baseado na vontade de uma minoria não é o ideal. Se a plataforma não funciona para determinada pessoa, basta essa pessoa não utilizar!

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Para mim, a internet antiga já morreu faz tempo, desde que se tornou massificada (não há aqui nenhum juízo de valor elitista ou superficialidade nostálgica), à medida em que a gradual democratização digital à moldou em novas formas, replicando as próprias imagens das sociedades reais de um modo hipercorrmpido, o que temos agora é uma herdeira da velha WEB, sua neta.

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Rapaz… eu sempre tive esse mesma sensação.

Tenho 45 anos de idade, uso internet desde 1995 e vivi essa época pré-explosão dela, que veio com o advento da internet grátis (na época da discada) e depois outro estouro com a popularização dos smarts phones e das redes sociais.

Eu lembro muito bem dessa época “pré-explosão”, em que internet era cara, e pra poucos, e cada pessoa não perdia tempo fazendo besteiras, porque sabia que cada minuto era precioso e era caro estar ali, então dava-se muito mais valor ao que se fazia. A massificação e a banalização do serviço são responsáveis por esse efeito colateral.

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A TV aberta passou por esse problema. Talvez estejamos precisando do “internetflix”. E assim poderemos selecionar melhor o que nossos filhos consomem, sem propagandas e menos preocupações se ele vai estar trocando mensagens com algum bandido.

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Lembrei aqui da frase do motd da finada, Rede de IRC, BrasNET:

“Use esse serviço como um privilégio, e não como um direito”

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Bandalheira quase sempre existiu na Internet, desde sua conversão de um meio experimental, de nicho, para um meio prático e aberto ao público em geral. A diferença em relação a décadas passadas é que:

(1) as redes sociais passaram a ser aparelhadas por populismos dos piores tipos, com grupos políticos e ideológicos agressivos dominando muito bem a lógica dos algoritmos (que não existe para servi-los, mas termina se encaixando muito bem em seus propósitos);

(2) a experiência com a Internet foi degradada pelas próprias corporações responsáveis pelo ecossistema principal de serviços e por boa parte da infraestrutura da rede, depois que entraram numa corrida hiperlucrativa de captação e processamento de informações deixadas pelos usuários da rede, e o problema intensificou-se com as interações da Internet com as Inteligências Artificiais, em especial com a sujeição da rede a aprendizado e pesquisa da parte das IAs.

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Como dizia Zygmunt Bauman, a sociedade contemporânea, que ele define como modernidade líquida, valoriza a quantidade em detrimento da qualidade.

O que matou a internet foi basicamente isso.

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Achei o texto excelente e concordo com várias das preocupações levantadas, especialmente quanto ao crescimento do conteúdo artificial e do tráfego de robôs.
Mas, pessoalmente, não acho que “a Internet está morrendo” (no sentido literal e sobre conteúdos). :sweat_smile:

Acredito que, com a popularização das redes sociais sem regulação e a presença cada vez maior de robôs e algoritmos, a Internet realmente se tornou muito mais ruidosa. Hoje é bem mais difícil separar o que é genuíno do que é manipulado ou artificial. Ainda assim, a rede nunca deixou de ter bons conteúdos, eles apenas estão mais enterrados no meio desse ruído.

Na minha visão, a Internet sempre teve um lado bom e vivo, mantido por pessoas que produzem, compartilham e aprendem de forma autêntica. Esse lado não morreu e, sinceramente, acredito que nunca vai morrer. O que muda é o esforço que precisamos fazer para encontrá-lo.

Também acho importante lembrar que toda geração tende a olhar para o passado com certa nostalgia. É comum ouvirmos o famoso “Ah, no meu tempo é que era bom…”. Esse tipo de comparação, embora compreensível (eu acho), às vezes nos faz cair em falácias ou vieses, idealizando um passado que, na prática, também tinha seus próprios problemas e limitações. A Internet do início dos anos 2000, por exemplo, era mais livre, mas também muito menos acessível e com menos diversidade de vozes.

Talvez (talvez mesmo rs) o grande desafio daqui pra frente não seja salvar a Internet, mas aprender a filtrar melhor, desenvolver um senso crítico e ferramentas que nos ajudem a navegar nessa explosão de informações cada vez mais artificiais e ruidosas (também, muitas das vezes, rasa e simplista). =D